Aparecimento de dores articulares que
melhoram com repouso é sinal de alerta para pais e professores.
Crianças são cheias de energia e passam a maior parte do dia correndo ao invés
de caminhar. Para ajudar a gastar essa “bateria” de forma saudável, muitos pais
matriculam os filhos em escolas de esporte e passam a estimular sua
participação em
competições. Se por um lado a prática de atividade física é
saudável e deve ser incentivada, por outro é preciso atenção para evitar a
superexposição da turminha aos exercícios de alto impacto, que podem vir a
provocar lesões sérias em ossos, tendões, músculos e articulações.
“Não existe fórmula: o sinal de alerta é o surgimento de dores articulares e
nos ossos que surgem com a atividade física e melhoram com o repouso e duram
vários dias, retornando sempre durante ou após praticar determinada atividade.
Nessa situação é muito importante consultar um ortopedista. Criança que esteja
sempre exausta em casa pode ser indicativo de exercícios em excesso”, orienta
Marcos Britto da Silva, professor coordenador da Liga de Ortopedia e Medicina
Esportiva dos alunos de Medicina da Universidade Federal do Rio de Janeiro
(UFRJ).
Profissional de Educação Física especialista em Psicomotricidade e pesquisador,
Sidirley de Jesus Barreto afirma que tanto o baixo impacto quanto o alto são
ruins à saúde óssea da criança. “Então, talvez seja válida a máxima chinesa: o
Tao, o caminho do meio.” Só que andar ou correr em terrenos que não sejam
planos também facilitam as lesões em qualquer idade. Residente no Vale do
Itajaí (SC), Barreto conta que a alta frequência de fraturas por estresse em
crianças e pré-adolescentes submetidos à sobrecargas de alta intensidade fez
com que fosse incluída no terceiro semestre do curso de Educação Física
disciplinas como “Pedagogia do Esporte” e “Crescimento, desenvolvimento e
aprendizagem motora”, além de manter a “Psicomotricidade”, para poder
conscientizar pais e educadores dos perigos do alto impacto nesse público.
O risco de uma superexposição ao impacto em ambientes como clubes e escolas de
esporte existe, principalmente com crianças com melhores resultados
competitivos, que costumam ser mais exigidas a se superarem. Dessa forma, o
acompanhamento de profissionais de educação física habilitados a trabalhar com
criança é fundamental em qualquer prática de atividade física para prevenir
problemas por excesso de impacto. Para Barreto, é preciso ensinar até as
gestantes a estimularem as crianças precocemente, propiciar uma educação
psicomotora adequada, dar educação poliesportiva, seguir o perfil personalógico
do indivíduo e nunca queimar etapas na hora de desenvolver os talentos esportivos
da turminha. Aliás, Britto da Silva explica que o conceito de criança é
bastante variável na medicina, podendo ir de 12 a 15 anos: “nas meninas, o
surgimento do broto mamário marca o início da adolescência, enquanto que para
os meninos é a troca de voz ou o surgimento dos pelos púbicos”.
Exercícios de alto impacto
infantil: cuidando do problema
“Excesso de impacto se corrige com reprogramação das atividades”, defende
Britto da Silva. Dessa forma, caso o profissional de Educação Física perceba
que a criança está se queixando de dor, mancando ou anda desanimada, deve
conversar com o pequeno e orientar os pais a procurar a ajuda de um
ortopedista, além de modificar a programação de exercícios para melhorar o uso
do impacto nesses alunos.
O uso de suplementos de cálcio é descartado pelo professor da UFRJ, que
ressalta que “o osso mais fraco nas crianças que não ingerem leite
adequadamente as torna mais propensas a lesões”.
Sidirley de Jesus Barreto indica o trabalho multidisciplinar como uma forma de
chegar ao tratamento adequado. Afinal, a combinação de experiências do médico,
do nutricionista e do profissional de educação física leva a um tratamento mais
completo e benéfico à criança. Ele propõe ainda a “musculação dos neurônios”
por parte dos profissionais de educação física: “temos que zelar pela
integridade dos benefícios de qualquer idade, principalmente das crianças, o
que requer estudo e troca constante com os demais profissionais da saúde”.
Mesmo fazendo atividades de
alto impacto, criança deve brincar
As atividades de impacto, como as corridas nas brincadeiras, são saudáveis e
necessárias para o desenvolvimento ósseo, muscular e psicomotor e não precisam
ser encaradas com a severidade de uma atividade física. Também não se deve
extinguir o impacto do dia a dia da turminha porque “brincadeiras com
movimentação articular são benéficas para o desenvolvimento da criança. Elas
têm que brincar, correr, mas também precisam descansar. É muito importante que
durmam de nove a dez horas por dia, porque crescemos durante o sono depois de
um dia de atividades físicas. Para a criança ficar mais alta, precisa correr e
dormir várias horas, além de ingerir cerca de três copos de leite diariamente,
tomar sol, ingerir proteínas, carboidratos, gorduras, vitaminas e sais minerais
em todas as refeições”, ensina o professor da UFRJ.
Barreto concorda e lembra que estudos indicam que a densidade óssea depende de
movimentos de torções e certo impacto. Portanto a estimulação motora é
fundamental para a saúde óssea: “não parece ser de bom alvitre a ausência ou a
baixa estimulação (aos impactos). Há indícios inclusive de que uma adequada
estimulação na infância pode trazer excelentes benefícios na prevenção da
osteoporose. Todavia, o excesso pode ser prejudicial em qualquer idade. O
overtraining prova que fazer mais exercício do que o corpo é capaz de se
recuperar é maléfico também”.
As crianças que passam muito tempo na frente do vídeo game e do computador
acabam menos expostas ao impacto, o que também é prejudicial. Além disso, a
falta de movimentação colabora com a obesidade infantil, que tem crescido de
forma alarmante e leva a outras enfermidades crônicas e preocupantes, como
diabetes e até mesmo hipertensão. Ambos os especialistas consultados concordam,
todavia, que o caminho é sem volta, já que a tendência é vivermos cada vez mais
num mundo tecnológico. “Creio que ainda é cedo para dimensionar realmente essa
constelação de problemas que o uso dos jogos eletrônicos vai trazer para as
crianças, mas acho que temos que buscar uma saída”, conclui Barreto.
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